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quarta-feira, 6 de agosto de 2014

ESPAÇO - AMBIENTE E COMPORTAMENTO URBANO



ESPAÇO – AMBIENTE E COMPORTAMENTO HUMANO



Jorge de Campos Valadares


Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo. 1
Carlos Drummond de Andrade



               Procuraremos, com o presente trabalho, mostrar a dificuldade de se lidar com o comportamento das pessoas relacionado com o meio ambiente.  O corpo já é um espaço de criações e invenções e, ainda, um ambiente que acolhe todo tipo de inquietações e nunca, ao se pensar, o homem coloca esse corpo em harmonia com o que se convenciona chamar de “natureza”.  Essa “natureza”, para o ser humano, é algo que, com a capacidade de pensar, o homem não consegue mais atingir.  E o “sentimento do mundo”, o sentir que a cada momento é um para o sujeito, depende mais de um movimento do que de um programa, por mais bem intencionado que seja.



INTRODUÇÃO


            Primeiro espaço a ser criado em direção a uma ação que situa, a uma “situ-ação” do sujeito: pequena ante-sala da conversa.  Conversar é sempre o início.   É ação conjunta, inaugural, que implica um sítio, corpo, movimentos, símbolos, relatos.  Partindo daí poderemos encontrar nosso Lugar, nossa Situação.
            Digamos assim: Espaço-Ambiente.  Espaço como lugar dos corpos em sua inquietude e procura de homeos-tase,2 que seria um apaziguamento para a sua inquietação: espaço com suas infinitas possibilidades de complementações, mas também do diverso e do divergente.  Lugar das lutas, de conflitos próprios da vida.  Não pensemos em equilíbrio, mas em múltiplos equilíbrios que se retornam, se desfazem, se repetem, independentemente de nossa pretensão do controle científico, e se transformam sem sabermos como.  Portanto, pensemos em des-equilíbrios.  E isso se dá mesmo quando o espaço está em suas dimensões menores, como acontece na sala do monge, um sítio que comporta a presença de Deus, ou como na “parede nua para se encostar”3, o muro onde o judeu reza em busca de permanecer com esperança, pois aí também há des-esperanças.  Mas sobretudo, não admitamos um espaço visto independentemente do olhar humano.  O olhar humano não vigia o mundo, se comove com ele.
            E Ambiente, lugar de sustentação, de holding,4 de aconchego, de acolhimento, sobretudo do inesperado, da perplexidade do novo, do susto, da Vida, portanto.  Que a Vida para nós seja a capacidade de assombro, de espanto.  Não pensemos aqui o susto no sentido do pavor, do medo repentino que nos pega desprevenidos e nos paralisa, ou mesmo nos faz fugir ou atacar.  Mas, pensamos na tranquilidade que nos dá a consciência da força para enfrentar a intranqüilidade, e no prazer de que conseguimos desfrutar diante de uma espera constante, que conta com aquele espanto como condição de “vitalidade da vida”.  É o que os filósofos chamam de Tauma, de perplexidade, e mesmo de capacidade de espanto.  Espera daquilo que vem sem nosso controle, que é dádiva graciosa, graça e por isso não nos apavora.  E quando temos à nossa frente, é a coisa mais simples que, em sua inesgotável leveza, sempre nos enche de novidade e esperança.  E a simples é tudo aquilo que a vida oferece, se a olhamos com o olho humano, aquele que procura mais a sabedoria do que o acúmulo de saber e que, por isso, não estaciona facilmente com o escabroso.  O escabroso é o que sempre queremos destrinchar com o olho de detetive, para procurar a razão, a ratio, a medida mais original e primeira que á a Causa.  Como se pudéssemos chegar à origem primeira das coisas.  Mas a tocamos, a essa coisa simples, quando podemos com ela nos “co-mover”, como por exemplo com a delicadeza de uma joaninha, ou com o som do vento na folhagem, ou o tom de azul do céu “que não é céu nem é azul”, mas porque assim o olhamos podemos dizer com o poeta: “lástima grande que não seja verdade tanta beleza”.  E continuamos, apesar da “lástima”.  Nos “assustamos” dessa mesma maneira, com o indesejável, com o lastimável do mundo.
            Porque essa estação, essa parada, é o ponto de uma viagem sem fim – a viagem da emoção.  E lembremo-nos sempre dos limites da “inteligência” humana, a se manifestar, por exemplo, nos frios “modelos econômicos” de hoje, e pensemos em seus resultados dilacerantes, na multiplicação que faz dos excluídos.  Liguemos sempre inteligência à sua raiz etimológica, inteligere – ler a partir do interior –, e mais inteligência temos quanto mais podemos ler desde o mais profundo em nós.  Não tenhamos medo da acusação de que “olhamos para nosso umbigo”, porque somente podemos estar no mundo se inicialmente nos situamos nele: onde começamos e onde começa nossas cogitações.  E isso porque sangramos, um dia, com a separação primeira e cada separação nos remete à primeira, para nosso imenso desamparo.5  Estarmos separados do mundo, percebermos que podemos “sangrar” nos faz sensíveis ao que vive e sofre no outro.  O outro, como nós, pode ter o sentimento do abandono mas, por isso mesmo, como nós, a cada momento, pode optar por companhias, ideias, gestos e solidões.  E neste ambiente larga-se e se larga, não se submete e se faz, guarda-se no mais profundo e perigoso ressentimento.  Não há governo e saber sobre o sujeito e seu grupo que os tire do seu ser mais profundo.  No humano, a profundidade é o sentimento.  Por isso não haveria nada mais profundo do que a pele, pois somente vivemos, separados do mundo se estivermos dentro de nossos corpos.6  Qualquer abordagem meramente intelectiva nos transforma em inteligentes almas penadas e nunca em viventes desse mundo de mortais.  Por isso, não desprezemos as emoções, as paixões, sobretudo as da inteligência.  E é percebendo os limites e as limitações do corpo e da pele que estamos diante do outro e do mundo.  Não desprezemos e não vivamos sem a ciência e suas razões, suas medidas, mas não acreditemos que o mundo comece ou termine ali.  A racionalidade, com os instrumentos que usamos para construí-la, é um dos caminhos que percorremos e que não dispensa os demais.
            Falamos de Espaço-Ambiente e pensamos também em biologia e seu território, e em geografia, arquitetura, engenhos, ordenações, leis, instituições.  Pensemos em instrumentos, dispositivos, inclusive os teóricos, mas consideremos as disposições que vêm sempre a partir do humano.  Pensemos na História, que é a geografia no tempo.7  Trata-se da imensa reconstrução do mundo, da casa do homem.  Pensemos na casa – em grego oikos – no mundo e no saber – logos – sobre essa casa; saber que se convencionou chamar de ecologia.  Imenso campo de convívio e de construção de memória, de recordações.  Vida de humano é isso: memória e convívio.   Sem um e sem o outro, desaparece o Homem, embora possa ele, ainda, sobreviver inteiramente desafortunado.
            Pensemos a casa desde acabana primitiva, feita de peles de animais8, e depois, com a técnica, desde a pele e o suor dos operários, onde a habitação no mundo é costurada, tecida, cultivada, enquanto o homem tece suas ligações às suas histórias e geografias.  Sobretudo pensemos nesse “umbigo” e nas separações para que consideremos nossos instrumentos de habitar.  Uma teoria da habitação somente pode ser construída a partir de uma percepção da “des-habitação”.9 
Antes tínhamos um mundo mágico que governava o pensamento.  Os deuses “exigiam”, de dentro do pânico ante o desconhecido, os primogênitos, para que viessem as boas colheitas.  Os animais, antes ainda, eram sacrificados aos poucos, na medida da necessidade de alimento: o corpo do animal era consumido aos pedaços, com ele ainda vivo.  Não havia um destacamento e era uma carne à custa de outra, carne como lugar de dor.  O sacrifício de animais em lugar do sacrifício do ser humano permitiu a substituição essencial: o simbólico.
A partir daí constroem-se as teorias.  Por isso dissemos que temos invenções de mundo e dependemos, para isso, de todos os tipos de afastamento que o homem faz, do e no sacrifício.  Há várias teorias e vários ideais.  É preciso que os conheçamos.  Devemos conhecer pelo menos um autor10 e uma teoria sobre a habitação da casa-mundo, não para segui-lo e sim para, a partir dele, considerarmos outros autores, outras teorias, e irmos criando nosso “ponto de vista”, nossa Situação do mundo.
  Não há situação sem “e-moção” ou, como dizem os arquitetos, sem um partido.  O partido, em arquitetura, é mais do que um saber sobre a paisagem, é uma “co-moção”, é um movimento emocionado com ela.  A escolha e aposta em um partido, que nos situa como criativos e inventores de novas situações humanas é que nos situa também como humanos, com um lugar que, no artesanato cotidiano, tecemos.  
Sendo Lugar do Sujeito, o Espaço-Ambiente é espaço de convívio, de possibilidade e impossibilidades, de encontros e desencontros, seja o quarto, a sala, a praça, a escola ou a linguagem.  E são lugares de memória esses espaços, porque ficamos ali com eles, pois estão sempre em nossas vidas como “rastros de recordação”, do nascer ao morrer, ou seja, a todo instante.  Não há memória sem imagens, metáforas, e não existem imagens de Espaço-Ambiente.
Esta introdução tem a finalidade de dizer que sem a arte, sem a poesia, não atingimos a significação que o “ambiente” e o “espaço” têm para o homem.  Esta foi a conclusão do grupo que organizou a Eco-92, evento que no Rio de Janeiro reuniu estadistas, pensadores e artistas do mundo inteiro, para pensar o destino que estamos dando ao nosso planeta.   Estamos acostumados a situar os poetas no mundo como vagabundos, bêbados, desocupados que não respeitam os que trabalham.  O poeta sabe que, para viver, morremos a todo momento, e que quando um ladrão invade nossa casa, despeja nossas gavetas, o que sentimos é uma devastação interna.  E não há outro recurso senão o poema para dizer de emoções como as devastações internas.  E quando se vê o couro de uma poltrona de couro, cortada com gilete, sente-se o corte  na carne.
Na casa-mundo, no Espaço-Ambiente, podemos sentir uma morte, um incêndio, e até algumas coisas mais.  Mas quando a escala aumenta, nas guerras, nas depredações, a narrativa se “transforma em estatística”, ou números cientificamente pesados e medidos.  Mas o poeta, em sua desmesura, pode nos dar, com a dimensão emotiva, algum socorro no “sentimento do mundo”, a partir do precário, de suas “duas mãos”, e da falta inamovível e dilacerante de uma precisão e, assim, ele diz que “viver não é preciso”.  E por isso, em sua casa, é capaz de guardar uma pedra, um pedaço de madeira encontrada no caminho, uma foto amarelada ou uma planta.  Porque o espaço da intimidade é lugar nenhum, sítio onde se abrem todas as perspectivas para o sonho.  Espaço, para o poeta, é antes de lugar de invenções, de criação, de metáforas.  E ele é capaz de tocar em uma praça o seu instrumento, porque o espaço público não é uma terra de ninguém, nem um espaço privado: é Lugar.  E todo Lugar é espaço de nascimento e de legitimação de sonhos, de linguagens: de sujeitos.  Aí temos lugares de ações, de viventes e morrentes, mas não somente de atores sociais, porque nesse socius não há lugar somente para hypcrités, como eram chamados os atores da tragédia, com suas máscaras e sua distância, mesmo que trágica.  Aí as pessoas são sujeitos não assujeitados a nenhum script, e devem viver, inventar a cada instante sua própria vida, e sabemos que isso custa, como dizem os novos poetas, “blood, sweat and tears”, sangue, suor e lágrimas.11
            Na psicanálise,12, a noção de falso-self, falso si-mesmo, tenta dar conta do sentimento da pessoa que representa o tempo inteiro, que vê sua própria vida passar como se fosse um filme, no qual apenas se assiste representada por outros, ou representa um personagem que não tem a própria procura de si como meta.  Um político, por exemplo, não é ator social: ele decide sobre o uso dos espaços, modifica-os e, com isso, sela destinos.  No “falso si-mesmo”, ou nas chamadas “personalidades como-si”, a vida não é desfrutada e o sujeito se comporta como a criança que não sabe se come o bolo ou se o guarda para um dia se dar o direito de saboreá-lo.13



            Queremos dizer:

·       Espaço-Ambiente é sítio, é local na paisagem: é amplidão e ponto.  Mas é também Lugar de acolhimento das tensões que, depois, vão se transformar em intenções.
·       Não há vida humana sem capacidade de assombro.
·       O céu azul, o assaltante, o mendigo na calçada devem ser vistos, no início do gesto criativo, com o mesmo olhar, porque “o céu azul não é céu nem é azul”.
·       Somente é solidário aquele que pode suportar a solidão.
·       O Espaço-Ambiente contém inicialmente o corpo do sujeito humano em suas inquietações e não há sentimentos “justos” que possamos medir, comparar, justificar.  Não é possível dizer: não é justo que chores, que tenhas ódio, medo...
·       O homem é memória e convívio.  Fora disso sofre de des-habitação.
·       Devemos nos “afastar” das coisas para vê-las melhor.  Não há necessidade, para se ver o humano, de um olho policial, olho de detetive.  Joan Miró 14 formulou assim: “não é preciso chegar perto para se tocar profundamente” e conheci a liberdade quando conheci a simplicidade”.
·       “Viver não é preciso” e “somente os poetas podem nos ajudar a compreender esse mistério.”



            2. O Espaço da Educação

É preciso não confundir educação com repressão. Algo que vem de fora e deve ser inculcado na cabeça das pessoas e impedirá a manifestação de outras tendências.  “Educar não é preparar para a vida, é a própria vida”.  Aprender é apreender.  Depende de uma sustentação da dúvida, que é a “devoção do pensamento”.  Sem dúvida e sem conflito não existe vida.  Queremos a continuidade e queremos a explosão de sentimentos os mais contraditórios.  Queremos a família e o “familiar”, como queremos o novo, o estranho e mesmo o extravagante.  Assim é o sujeito e não adianta negá-lo.  Educar-se é um exercício da espera e da esperança.  Freud15 nos diz que quem sabe esperar não precisa fazer concessões.  Educar-se tem a ver com o cultivo, com o cultivar.  Com a posse de frutos e com o desfrute desde o fazer, o sentir-se criativo, produtivo e tomando parte da produção – da poiesis – do mundo, campo da poesia que não se desvincula da mínima ação cotidiana.  Mudar uma pedra de lugar é um ato produtivo, uma poiesis.  A poiesis está ligada a algo que foi recalcado, à animalidade com a natureza que somos e, ao mesmo tempo, perdemos, àquilo que ainda está em nós e a que não temos mais acesso pois, embora nunca tenhamos de lá saído, somos, paradoxalmente, exilados desse território dito natural.  Somos também seres de cultura, não mais somente seres de natureza.  A inquietação própria do humano existe porque não podemos ficar aqui ou lá, devemos sempre procurar nosso Lugar, lugar de sujeitos, de não assujeitados: Lugar de invenção, portanto.    
 A educação está relacionada ao novo, ao externo, mas não pode deixar o antigo, o perdido, o Lugar de origem, que pode ser o corpo, suas inquietudes, andanças, ou seu repouso na natureza.  Dele sentiremos sempre saudades, lá estão o coração, o espaço da percepção, do sentimento e o sentido primeiro.  É lugar de eterna “re-cord-ação”.  Por isso a lembrança é mais do que um traço que produz suas marcas, mesmo que permanentes em nosso corpo.  É, isso sim, o próprio corpo ou seu pedaço perdido que pulsa, ou ainda o pedaço de vida que busca humanizar-se nesse sentir da ausência, da falta, sentir esse que nos impulsiona e nos toca diretamente o coração, e que a palavra re-cord-ação traz em sua raiz. 
Vejamos o que nos conta Guilio Carlo Argan,16 o historiador da arte, a respeito de Michelangelo:17 “após cada obra o esforço deve ser repetido desde o início, porque não importa tanto a perfeição da obra quanto o empenho, o tormento, o anseio inesgotável do artista.”  Como na clínica, também na educação a arte é mais importante do que a ciência.  E Freud assim também pensou no empenho (Burgschaft) como condição central.  E consideremos empenho, com o sentido de penhora, o sentido em que a palavra deve ser a única garantia da “ek-sistencia”, a vida fora do corpo bruto: fora do animalesco.  O corpo é esse início de Natureza, que deve conter tensões cada vez mais complexas e, quanto mais evoluímos, mais presos estamos ao motor, ao movimento que deve nascer sempre de uma musculatura que é sempre “redesenhada”, repensada, juntamente com os “instrumentos” que a prolonga.  E esse replanejamento deve ser feito na ação, que é o que cria a nova técnica, o próprio presente e a presença, apesar de todo o fundamento estar no passado, nas recordações, na história e também no futuro, no sonho. 
Michelangelo, pensando na vocação para a elevação que tem o humano – a educação, a cultura e a religiosidade, as religações, ocupando lugar central – disse que o peso, “a massa é sempre o ponto de partida”, em direção à leveza do humano.
A Educação é um Espaço de “des-coberta” e de invenções de novos gestos, de novas ações.  Não é possível desvincular a educação do Espaço-Ambiente.  Não se trata de uma cena como a do teatro, onde se assistem, se estudam as determinações da vida.  Aí se vive.  Antes a organização do grupo e a organização interna do sujeito sustentaram, acolheram.  A família foi um lugar inicial da educação e, seja qual for a família, de forma melhor ou pior, ela acolhe e sustenta, ensina continuidades e cortes próprios da vitalidade.
Dois filmes da atualidade18 nos dão a noção do conteúdo profundo da educação e da responsabilidade do educador: Cinema Paradiso e Sociedade dos Poetas Mortos.  O primeira pensa o espaço contido no tempo.  O corpo pode assimilar vivências e o mestre responsável pensa “exercícios”, experiências que somente serão possíveis depois: no caso, cenas de amor dos filmes, as quais a criança – ajudante do mestre operador do cinema – não tinha, ainda, como viver.  Os grandes mestres, por gestos como esse, ficam em nossos corações, mesmo que desapareçam para sempre.  O segundo filme fala do tempo contido no Espaço, nas presenças.  Não é mais questão a memória, mas o convívio: Carpe diem, aproveite o dia, nos adverte o poeta, mesmo que do outro lado da vida.   

Por isso o professor é, por excelência, aquele do adolescente.  Todos não o são? O “caminho para a dor”, ad dolore, dá origem à palavra adolescência.  A dor não será sempre de perda ou perdição, mas aquela da e na “in-conformação” da infância que se vai e está sempre aí, como o corpo do animal, que não se separa e deve ser sempre separado, desde dentro de nós? Caminho em direção a uma maturidade? Um estado adulto não seria aquele que nunca chega, que é apenas promessa?
Como Educar? É como amar.  “Amar se aprende amando” e, recorrendo mais uma vez ao poeta, ama-se “quando se arquiva toda a ciência, herdada e ouvida”.  O assunto da Educação implica em um deslocamento, em passeios, em um transporte, um enlevo e uma elevação.  Podemos visitar com um grupo de alunos um monumento, uma estrada de pedra, antiga, ou alguma reserva ambiental.  O deslocamento físico não garante, mas ajuda.  Há descrições, saberes.  Mas deve haver também sabores.  Educar é libertar da repetição, do gesto bestial, do sistema motor puro.  É prazer também.  É “co-moção”.  Com a Educação saímos do nosso ensimesmamento, mas a partir do nosso si-mesmo.  Educere é um processo de dentro para fora, de abertura em direção ao mundo.  É um processo de sentimento, porque devemos descobrir uqe o “mundo é maior do que o nosso coração” e que “o que está dentro está fora” e que ficamos com o espaço da invenção como único Lugar que nos reconstitui, aquele que não é sempre repetição do mesmo.  Como seres humanos, portanto.  O passo, o andar, o caminhar em uma cachoeira são diferentes de uma descrição e suas imagens.  Por isso, artistas como Lygia Clark dizem que o próprio caminhar é a construção de uma obra de arte.

Queria dizer:

·       “A dúvida é a devoção do pensamento”.  Quem tem certezas somente apenas sobrevive.
·       Não somos seres de natureza, somos seres de cultura.  “Somos exilados de um território do qual nunca saímos”.
·       Educamo-nos saindo de condicionamentos, e não quando assimilamos condições.
·       “Educar não é preparar para a vida, é a própria vida”.  Devemos, como professores, aprender a conviver com nossos alunos.  Não interrompemos a vida para ensinar.
·       A “ciência herdada ouvida” deve ser “ar            quivada”.  Quando precisarmos, recorreremos ao arquivo.  No convívio, o mais importante é a presença, o presente e a alegria de encontros e reencontros.  O convívio é a renovação da memória e da história e comoção com as paisagens e com as presenças.


3. Não pensar o Espaço-Ambiente somente como distância, e afastado da convivência: daquilo que é, ao mesmo tempo, continuidade e corte na “Vitalidade da Vida”, fragmentação, morte e também a vida, a força para o enfrentamento do caos e da dor.


            O homem está no mundo ao transformar a natureza em cultura.  Ao fazer sua pulsação com as coisas ficar contida em caminhos que escolhe e ao deixar de ficar misturado e indiferenciado do mundo.  É um trabalho que exige esforço.  Não é possível afastar a degenerescência dos corpos, todas as doenças, a dureza das intempéries, vulcões, terremotos, furacões, tempestades etc.  Domamos a natureza, inclusive no nosso próprio corpo e suas pulsações, domamos o mundo que nos invade os sentidos com suas seduções, encaminhamos energias, produzimos conforto e diminuímos o esforço com o auxílio da técnica.  As estradas e ruas encurtam distâncias e são exemplos desses caminhos.  A proximidade das coisas, seu poder de sedução sobre o corpo e a percepção devem ser continuamente pensados.  Algo de esforço, “para a sustentação da coragem”, como a etimologia da palavra conforto sugere, deve sempre se requerer do homem e de suas técnicas para a sustentação do humano.  O conforto não nos deve deixar inermes.  Estamos fragmentados pelas graças do mundo, mas não podemos sucumbir a essas graças nem ao caos que nos ocasiona para não voltarmos à animalidade.  Uma pessoa em uma cadeira perfeitamente anatômica, diante da televisão, a lhe dizer quais são os seus mais recônditos desejos, está como um animal domesticado.

            Ao tentarmos domar a natureza ficamos, aos poucos e cada vez mais, presos aos restos da vida que foi por nós vivida.  Naquilo que é deixado como resto, no instrumento maior do viver – nosso corpo – nos perdemos.  E é aí que nos devemos deter para ver o que ficou esquecido no caminho e no caminhar e não foi aproveitado.  A sustentação do ambiente depende de uma sustentação do sujeito.  A comunidade não pode explorar a natureza, assim como não pode explorar o esforço de seus sujeitos.  Um faminto não tem como se “pré-ocupar” com períodos de reprodução, com a desova de animais marinhos, com a proibição de caça e pesca.  Não há como não ficar perplexo com pesquisadores que invadem nossas casas, colhem todos os tipos de informações e amostras, e depois vão embora.  A sustentação do sujeito, de sua intimidade, de seu recolhimento, de onde pode sair retomadas depois da exaustão é condição para que ele possa se preocupar com continuidades, com as gerações futuras, com autossustentação do ambiente.    
  A questão do grupo é, pois, uma questão central.  O vizinho, em seu “quintal” é diretamente afetado pelo que deixamos de lado, seja ele o que está em outra casa, em outro bairro, na oura margem do rio ou em outro país.  Não há grupo que possa ser delineado em número de humanos ou em número de bens, mas a humanidade, na história e na geografia, deve ser contida, em temas, em espaços e tempos, posto que “só têm jeito as dificuldades que têm tamanho”; mas, apesar de assim recortada a humanidade, o sujeito e o grupo sempre conservarão a continuidade do humano.  O saber, e a sabedoria, principalmente, não dispensam as épocas nem seus espaços. 

Pensando nossas “necessidades” e o que têm de central para acionar nosso desejo e prazer, nossa vida, portanto, vemos o quanto elas dependem do mundo e do outro. No grupo está também todo o ausente, como lembrança, recordação sem a qual não vivemos.  Por isso o grupo pode esconder, adiar o sentimento, o desejo de inclusão do outro, mas não tolera os preconceitos.  Os momentos da humanidade em que se desprezou este fato foram fatídicos.
A psicanálise, pensando no resto impulsionador das procuras, reparte, destrincha as palavras que usamos, na esperança de procurar a formação das primeiras imagens e dos primeiros sentidos.  Nas palavras empregadas pelos sujeitos está a sua pro-cura, para a psicanálise.  Nem sempre essa partição está fundada na etimologia mas nas escolhas de expressões feitas pelo sujeito.
  Voltemos ao ausente, ao faltante que nos impulsiona.  Sempre se pergunta por que “limpamos nossa área” e sujamos outras? Como se o “i-mundo” devesse ser o outro? E o outro deve cooperar na “con-tensão” dos mundos internos, de não mundos externos, ”reais”.  Porque o que pesa para o sujeito não são as “representações”, as imagens que carrega e que deve conter.  Essas já são “temas”, são questões organizadas, tematizadas.
A verdadeira carga humana são os afetos que, de dentro de nós, irrompem, às vezes com verdadeiros terremotos internos, nos trazem pânico e não sabemos como encaminhá-los.  Basta observarmos nossos sentimentos diante de doenças desconhecidas pela ciência, de questões ambientais ainda sem solução, como a chuva ácida, o aquecimento da terra, o furo na camada de ozônio etc.
Vejamos sempre o avesso que a psicanálise descobriu.  O mundo interno, aquele das cogitações que não nos abandonam e que nunca são integralmente “confessáveis” é o “i-mundo”.  O pecado sempre foi o melhor, o inarredável, e por isso existem as leis.  Nossa criatividade, dependendo sempre do pecado, da transgressão, daquilo que sempre foi proibido em nosso mundo interno, em nossos sonhos, dependerá sempre do i-mundo, do inenarrável.  Ele está no outro, como está em nós: como riqueza, possibilidades que sempre partem de outras épocas, outras invenções, outras legitimações, de restos desprezados, riscados, excluídos.

Assim como se inventam técnicas novas inventam-se também maneiras de situá-las e ao técnico que as criou.19  O grupo, em sua contínua necessidade de convívio, a partir do caminho de cada um de seus membros, saberá se há poluição em um rio em virtude da presença de peixes mortos, se o ar está contaminado em virtude da presença de bronquites e um contínuo servindo café ensinará aos técnicos de uma área metropolitana que, diante do perigo das inundações, o bombardeio de nuvens que viu ser usado em um cultivo de maçãs em sua terra de origem, quando a floração estava ameaçada por uma possível chuva de pedra, seria medida valiosa.  A criação e a arte são mais um trabalho de florescimento, dependem de crescimento dos sujeitos e dos grupos e, como no caso de uma árvore, não pode ser apressado pois “cada árvore tem o seu arvorecer”.  O reconhecimento de uma técnica e de seu artífice não é questão científica, embora a ciência coopere nessa legitimação.
Os projetos, por mais altruísticos que sejam para os grupos, devem respeitar os sonhos dos sujeitos, porque cada um somente pode conter seus sistema motor e seu corpo se lhe ficar a esperança.  A esperança de ter tido uma sustentação que lhe permita suportar descontentamentos, esperança sempre reativada no convívio.  S projetos são uma continuidade dos sonhos.  Com o sonho e o pensamento adiamos a descarga motora e escrevemos nossa história.
A pobreza, a doença, a fome são inaceitáveis na ordem da alegria, que é motivo de vida.  Dizemos motivo e pensamos em movimento, delineamento, impulso e razão.  A pobreza, a fome e a doença devem ser afastadas para se afastar o ressentimento.  Assim como a voracidade às vezes nos retira a sensatez, devemos contê-la e devemos nos deter na mágoa que essa ganância provoca.  A ganância irrefreada dos bancos e agiotas e seus juros é o exemplo social maior dessa voracidade,20 o que provoca um imenso rancor em virtude da devastação que traz consigo.  Em sua devastação sobre a terra – pois “estão agindo como predadores” – nem o próprio nome é mais conhecido, em decorrência do mascaramento produzido pela telemática,21 embora, por outro lado, até mesmo o “sobrenome” de alguns seja de fácil enunciação.   
A atividade de um poder público, de um governo, é indispensável para a verificação do impacto de ações sobre o meio ambiente, fixação de prioridades e prazos, avaliações e destinação de orçamento e pessoas envolvidas.  Um poder legitimado pela população é referência e limite para o que é desmesura, nas ações que não consideram o outro.
A continuidade do nosso Espaço-Ambiente depende de considerações, cuidados.  Só é possível crescermos sem destruir o outro e os sítios, se for viável desvincularmos qualidade de quantidade, e produzirmos alguma ligação entre ecossistemas biológicos22 e sistemas sociais.  

Deixemos para o mundo, para as gerações futuras, um Espaço-Ambiente: um sítio, uma forma de apreendê-lo e uma Situação possível para os sujeitos.  Os adolescentes são especialmente sensíveis ao que fazemos.  A revolta ante o descaso pode despertar um sentimento destrutivo.  O trabalho com adolescentes é de central importância, pois “contra a herança (ecocida) dos progenitores23 um adolescente sadio reage e se defende com desespero agressivo”.  Dez-se que “o adolescente ama o amor e esse amor assim introjetado, de maneira tão ideal, pode, se revoltado, ter consequências nefastas.24
Parece que o tema ambiental é relativamente novo, como preocupação com limites do humano.  A industrialização, com sua técnica, iniciou um trabalho de afastamento do homem de seu sentimento de si-mesmo, pois o homem passou a se constituir como um Deus de próteses.25  Esse afastamento pode se iniciar nas roupas, nos meios de transporte que prolongam os passos, nos sistemas teóricos que se pretendem mais potentes do que o corpo.
A novidade nessa consideração, o desconhecido dessa abordagem na qual todos ainda nos iniciamos, na qual tateamos, coloca professor e aluno lado a lado, em uma pesquisa que pode retomar algo abandonado com as pré-tensões do saber: a consciência de que estamos todos no mesmo barco, que o que constitui o humano é justamente a precariedade, sobre todos os aspectos.  Somente assim poderemos atingir a capacidade de pré-ocupação, de concern, que dá origem a uma ocupação com o mundo, termo de Freud, para investimento afetivo, o sentimento de posse – Besetzung – que é a liga, o cimento da pessoa no mundo.  
A partir daí podemos falar em solidariedade.  Implicados pela possibilidade de ligação, que vem somente da possibilidade de sustentar o sentimento de solidão e de precariedade.  Não há possibilidade de famintos, doentes, miseráveis sustentarem o ambiente.  É necessário que, antes, o ambiente os tenha sustentado em sua solidão, em suas separações.  Daí vêm as implicações, daí vêm graças e gratidões em lugar de mágoas e ressentimentos.
E então ficaremos com o fardo de podermos contar somente com nossas duas mãos – um corpo – e o sentimento de estarmos nesse mundo que, afinal, é “maior do que o meu coração”.
  

Queria dizer:
·       O conforto implica em uma reserva de forças para a sustentação da coragem.  Por isso dizemos “vamos dar uma força” a esse ou àquele amigo, ou “vamos confortar” nosso mestre, que perdeu um irmão, a mulher.  Sabemos que ele já tem internamente a força que lhe “damos”.  Somos apenas testemunhas disso.  A gente deve contar sempre com alguma reserva para sustentação da coragem, fonte do nosso amor próprio, por onde entramos em contato com nossa capacidade de enfrentamento do infortúnio.  Por isso não devemos deixar que nos humilhem.
·       Um homem faminto somente é possível pela degeneressência do comportamento da comunidade humana.
·       “O inferno são os outros”.  J. P. Sartre
·         O saber verdadeiro é sabor e vem somente com a vida.  Não devemos interromper nossa vida se queremos aprender.  O mundo e o caos devem ser também o lugar de acolhimento, para que reencontremos nossa força para continuar.





“O mundo é maior que meu coração.”


POSFÁCIO


            Não sabemos, de início, nada sobre o Espaço onde estamos e o Lugar que ocupamos entre aqueles com os quais convivemos: saber tem a mesma raiz da palavra sabor, e o verdadeiro sabre depende da experiência.  Mas depende também, além de ser valorizada, da sua capacidade de aprender a valorizar essa experiência, sempre única para cada sujeito e, por isso, a importância de sua contribuição no delineamento daquilo que, para o homem, realmente, é o mundo.  Dessa singularidade da experiência humana “sabe” cada pessoa.  A condição de sujeito humano, de não assujeitado, vem de uma insistência, impossível de afastar de nós mesmos, naquilo que “sabemos”, naquilo que a vida nos deu.  Por isso é impossível um programa de bons comportamentos relativo ao ambiente.  O próprio corpo – Espaço inaugural de todo “saber-sabor” e Lugar de início e fim de nossa situação – não permitirá que, por exemplo, pescadores famintos não pesquem em ocasião de desova.  Algo deve ser feito pela sustentação e Situação do Sujeito, que é mais que a possibilidade de sobrevida – é possibilidade de vida, de histórias e histórias, e para isso, precisa ele de convívio.  Somente se sustentado, acolhido, o sujeito pode começar a pensar em autossustentação do ambiente.      


NOTAS

1As duas mãos como imagem da precariedade do corpo são ao mesmo tempo, a sofisticação do corpo, que desse modo fica mais preparado, e um instrumento de viver.  “O sentimento do mundo” são emoções imprescindíveis que cimentam uma invenção de “continuidade” no que a vida tem de fragmentária.

2E agora José? É um trabalho do poeta que devemos repetir quando de-existimos de imagens e guias.  É quando percebemos que “lo que brilla com luz propia nadie lo puede apagar”. (René Major)

3Homeostase é a tendência dos organismos vivos de manterem constante seu equilíbrio (parâmetros biológicos) ante modificações do meio anterior.

ideia de holding do psicanalista inglês D. W. Winnicott tenta nos dar conta do acolhimento de que necessitamos desde os nossos primeiros momentos.  A mãe com um filho nos braços que fica com uma perna ou um braço solto e que balança quando ela anda... é a imagem de um holding precário.  A mãe funcionária que não tem tempo para o colo... o país cuja economia vai bem, mas o povo vai mal... (Winnicott, D. W.: O brincar e a realidade. Rio de Janeiro, Imago).

5Falamos sobre separação pensando na capacidade de estar só.  Só é possível nos preocuparmos com o outro e com o ambiente se pudermos escutá-los.  E cada coisa tem seu silêncio e sua linguagem.  Quem não pode “sangrar” com a separação ficará tributário de u sentimento de onipotência, de uma ávida imaginária em que “se pode tudo”, e verá sempre o outro como seu apêndice.

6Falamos em limite dos corpos e pensamos em ritmos, em tempo de fadiga, em alimento, em transporte, em tensão suportável, em necessidade da experiência do prazer corporal, no desfrute da vida, que implica uma vivência do corpo e da corporalidade.  Falamos em lazer e em trabalho como termos complementares, que marcam a existência do corpo.  Não existe uma boa teoria se ela nos faz ausentes de nossa vida em encorpação, em uma inteireza do corpo 

7Pensemos na fragmentação a que estamos sempre submetidos quando pensamos na história e nos espaços da cultura.  Mais que fragmentação, admitamos os despedaçamentos diante da imagem de uma ilha grega, de uma catedral medieval, de um moinho de vento.

8Ver Heidegger, M. Essais et conferences, Gallimard. Sobretudo os ensaios “O homem habita enquanto é poeta”, “construir habitar e pensar” e “A pergunta através da técnica”.        

9Arquiteto Heberto Lima da Silva foi Superintendente do extinto Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFAHU), órgão que elaborou mais de 450 planos para cidades brasileiras.  Ele diz que o Movimento dos Sem Terra (MST) é o único movimento social que existe hoje no Brasil e adverte para a atual epidemia de des-habitação e des-urbanização que enfrentamos.  O projeto do MST é um projeto de sociedade que, além de teto e trabalho, pensa em convívio e nos limites dos sonhos, dos projetos e dos corpos, justamente aquilo que constitui o humano.  Ver também nosso trabalho: Espaço-Ambiente e Situação do Sujeito. Tese de doutorado na ENSP-Fiocruz. Rio. 

10Em qualquer aprofundamento do saber o ideal desempenha um papel primordial.  É, desde o delineamento da imagem do pai, “o gigante que chora”, que nos separa das paixões (pathos) por nós mesmos, até os grandes mestres e autores, o que está para além dos deuses (theos) e das teorias, nos liga ao mundo humano e à possibilidade de diálogo e entendimento.  Ver até o fim da obra de um autor implica uma necessária admiração, mas também examinar o que ele deixou como resto inexplorado, uma possibilidade de esgotamento do imaginário, e na desistência de um deslocamento nosso para uma situação de satélites.

11Fernando Pessoa nos diz que “O poeta é um fingidor.  Finge tão completamente, que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente”.  Mas o poeta tem luz própria e isso porque não segue cegamente ninguém e nenhuma teoria.  Ele necessariamente cria, inventa o mundo.  Liliana Cavani diz, em seu magistral filme “Gestos de Amor”, que uma língua viva é uma língua de poetas vivos.  Mas toda produção poética depende do texto de outros poetas.  Ver Rorty, R. Contingency, irony, and solidarity. N.Y. U.S.A., Cambridge University Press. 

12Psicanálise Método de investigação psicológica concebido por Freud, empregado no tratamento das neuroses através da procura de tendências reprimidas no inconsciente do indivíduo e de seu retorno ao consciente pela análise.

13Ver, sobretudo, Fairbairn, W. Ronald.  Fatores esquizoides da personalidade, in Estudos psicanalíticos da personalidade. Rio, Interamericana, 1980.

14Joan Miró Pintor espanhol (1893 – 1983).  Autor de obras surrealistas e abstratas.

15Freud, Sigmund Psiquiatra austríaco (1856 – 1939).  É o fundador da psicanálise.  Principais obras: A interpretação dos sonhos; Três ensaios sobre a teoria da sexualidade; O inconsciente, introdução à psicanálise; Psicologia das massas e análise do ego; Psicanálise e teoria da libido; Neurose e psicose. 

16Giulio Carlo Argan Crítico e historiador de arte italiano (1908 – 1992), um dos mais importantes do século XX.  Professor das Universidades de Palermo e Roma, criou nesta cidade o Instituto Central de restauração.  Foi prefeito de Roma e senador.

17Micheangelo Pintor, escultor, arquiteto e poeta italiano (1475 – 1564). Suas obras são admiradas pela diversidade e pelo caráter grandioso.  Deve-se-lhe a cúpula da Basílica de São Pedro, no vaticano, os afrescos da Capela Sistina, esculturas famosas como a Pietà, Moisés, Davi, entre outras obras-primas.

18Vale a pena uma atividade didática se iniciar com a discussão de dois filmes como esses.

19Heidegger, no artigo sobre a técnica supra citado, retomas as quatro “Causas” – a palavra é latina e significa, originalmente, queda – de Aristóteles e, usando o exemplo de um cálice de prata pelo sacrifício religioso, localiza magistralmente a questão.  Há a primeira “Causa”, a material ou materialis, que determina a escolha do material, no caso, a prata.  Com isso todos os outros materiais foram abandonados, o ouro, o estanho... e ficamos com uma culpa e uma dívida – a palavra alemã é schuld, a mesma para dívida e culpa – para com a natureza, pela rejeição desses materiais.  A segunda “Causa”, a formal ou formalis, determina que a forma será a de cálice, “e não de bracelete ou anel”, e mais culpa e dívidas são acrescentadas na evolução feita da invenção da técnica.  A terceira “Causa”, a final ou finalis, determina o uso religioso do cálice, e a quarta “Causa”, a eficiente ou eficiens, situa aquele artesão e não outro como o competente e escolhido, acrescentando mais abandonos, culpas e dívidas ao trabalho da cultura.

20O presidente da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, Carlos Alberto reis, diz, além disso, que os especuladores são verdadeiros exterminadores, e que “banqueiro não tem coração”.   Preferimos dizer que tem um coração perdido.  E, se tivermos esperança, podemos também dizer que somente quem se perde pode se encontrar.  Mas quem determina os tempos das “pro-curas”?  Ver Jornal do Brasil 19/01/99.

21Telemática Ciência que trata da manipulação e uso da informação associando recursos de computador aos meios de comunicação.

22Ecossistemas biológicos Conjunto dos relacionamentos mútuos entre determinado meio ambiente, sua flora, fauna e microorganismos.

23Ver Cesarman, F. Homem o agressor.  Estudo psicanalítico da destruição do meio ambiente.  Documentário.  Rio de Janeiro.  Sobre as questões de comportamento, estado do ambiente e medidas necessárias, ver também Brundtland Gro et al. 1988.  Nosso futuro comum.  Rio de Janeiro, FGV, e as publicações da Secretaria do Meio Ambiente do Rio de Janeiro relativas à Agenda 21, principalmente a “Cartilha 21 Local”, trabalho de primorosa qualidade.  Nosso futuro comum” é um trabalho de fôlego, uma síntese muito cuidadosa do que se sabe sobre o estado atual em que se encontra nosso planeta, elaborada pelos mais competentes ambientalistas do mundo, e serviu como documento-base para a preparação da Eco-92 do rio de Janeiro.

24Norteamo-nos pelos ideais.  O estudo psicanalítico é, no fundo, um estudo dos ideais.  A idealização, um trabalho de sonho que pode se transformar em pesadelo, é um exagero no esforço da construção do ideal.  Sonhamos, pensamos e projetamos a partir de imagens e guias que construímos, a partir de pessoas a quem respeitamos, e como isso nos distanciamos de uma fruição puramente corpórea.  E nos damos, com esse espaço, um tempo para escolher nossos caminhos.  O ideal é um colorido feito com a energia da pulsão.  Essa é uma construção teórica de Freud, que tem uma “representação”, uma imagem que vem das lembranças, das recordações de momentos que guardamos.  Essa imagem é colorida, com maior ou menor intensidade, pela energia que vem do corpo e constitui os afetos.  Assim como a cachoeira tem uma energia que pode ser transformada em imagem na televisão, o corpo tem uma energia que, nos humanos, é transformada em sonho.  Na idealização o afeto pode atingir uma força enorme e colorir representações de forma positiva ou negativa, chegando às vezes a nos paralisar ou a nos levar a atos “im-pensados”, isto é, pensados de maneira inconfessável.

25Freud se refere, no Mal estar na Cultura, Rio, Imago, 1974, a essa imagem terrível do Deus de próteses e à agressividade a ela ligada.  



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