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quinta-feira, 20 de março de 2014

A DIVERSIDADE DAS  SOCIEDADES E DOS SERES VIVOS, E O COMPORTAMENTO HUMANO


Jorge  de Campos Valadares1



                        Colaboradores: Arthur Soffiati, Carmen da Poian, Célio Garcia, Elida Séguim, Frederico Peres, Heberto Lira Ferreira da Silva, Isidoro E. A. do Brasil, Ivonette  Almeida, Jorge Ossanai, José Carlos Guedes, Lena Bergstein, Lúcia Osório, Marcos Fernandes da Silva Moreira, Marilene de Castilho Sá, Maria José Salles, Mônica de Azevedo Meyer, Odir Clécio da Cruz Roque, Renato Caporati, Ricardo Silveira, Sílvia Barbosa de Carvalho, Teresa Cristina Coury Amin, Wilson Benes de Oliveira Cardoso.


“O ocidente desencantou o mundo.”
(Max Weber)


I – INTRODUÇÃO

            De início, o grupo discutiu o destacamento do homem com relação à natureza.  E esta separação conferiu ao homem uma distância e um olhar.  Mas, ao mesmo tempo, também lhe deu uma centralidade que lhe tem sido, pelo menos às vezes, nefasta.
            Vemo-nos, assim, diante de uma primeira pergunta.  Como pode o homem se autorizar tal inverdade: dizer-se ausente de um território do qual nunca saiu? A que lucros visa, e a que prejuízos decide expor-se? Para poder olhar a natureza, ele deixa de notar que ela percorre o próprio corpo, abandona uma vitalidade.  Mas se a posição certa arrebitou o nariz humano, não o livrou de um saber/sabor de que nasce entre fezes e urinas.  O trabalho do conhecimento é um trabalho de co-nascimento.  A cada passo o homem se faz, e faz um mundo semelhante às limitações ou às grandezas de suas utopias.
            A questão é de natureza ética.  Toda ética está ligada a um fazer.   O que se pode fazer com uma discussão, um pensamento? Que ações desencadeia? Que lucros teremos com os pensamentos e as ações que se lhes seguem, quando tantos seres são excluídos do conhecimento/co-nascimento? Sabemos que a evolução da ciência não está permitindo a inclusão e, ao contrário, produz cada vez mais distâncias.  E que o aprofundamento nos saberes fragmentários tem levado a afastamentos, isolamentos.




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1 Pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública/FIOCRUZ












A diversidade das sociedades e dos seres vivos é essencial à saúde do mundo, e depende inteiramente do trabalho do homem.  Assim, há riscos e responsabilidades.  Faz-se necessária uma ética da responsabilidade, pois a diversidade dos seres vivos é essencial à vida na terra.  Mas como assumir o respeito pela vida?  O saber e a técnica, essenciais ao fazer e ao fazer-se do homem, já implicam em domínio, em poder.  O arranjo, o manejo do território dividiu o espaço da cidade, das cidadanias, desde as cavernas e as raízes do sistema aldeão-palacial, em espaços do castelo, da catedral, e de outras moradas, e instituiu práticas, hábitos, costumes.  Como decidir sobre as desigualdades injustas? A igualdade, a equidade e, portanto, o combate ao diverso pode instalar-se de maneira ética: quando e em que não se deve tocar? Mutilações teriam sido justificadas em certas culturas, até nossos dias, mas hoje não cabem mais.  Assim se dá na causa feminina, na causa indígena e em outras causas.  
           
A cidade não é lugar de pirâmides, de túmulos.  A cidade é um espaço de vida, de co-habitação da paz.  E “não procuramos a paz de cemitérios e dos silêncios aterrorizados”, de poderes paralisadores, de burocracias estagnadas, mas a “paz de avanços” (Aguiar, 1993), de voos e de liberdade.  A praça, a casa, a fábrica, são locais de convívio e de vida e a organização das construções deve obedecer a esse princípio.  A verdadeira cidade é lugar de devires, a diversidade dos seres vivos é um território de insurreições que se constrói através de caminhos e movimentos variados, entre chances e perigos, pois, para o homem, “somente há salvação onde há risco” (Heidegger, 1990).       

            A salvação implica, assim, em uma religião, uma religiosidade; exige mais do que uma representação, uma percepção contínua; exige o reencantamento do mundo.  Mas como encontrar esse lugar se o conflito, nunca negado, é a fonte da criação e da vida? Se a diversidade é da ordem do cotidiano e, ao mesmo tempo, nos exige uma entrega? A ciência saiu do lugar de salvação para o caos da poluição e do esgotamento dos recursos da natureza, a que ela própria nos tem levado.  O documento preparatório da Eco/92 (Harlem et. al., 1988) já nos afirmava isso.  Uma distância capaz de, paradoxalmente, providenciar um reencontro, não se dará através de uma razão que insista em dominar, seja a natureza, seja os homens.  A invenção de novos espaços-tempo dependerá mais da con-sideração das contradições do que das linhas de fuga.

            Cada vez mais, tecnologias prometem solucionar nossos problemas com o tempo, mas, ao contrário, desgastam energias e nos exigem mais tempo e mais criatividade para exercermos nossa condição de sujeitos.  Precisamos de novas formas de energias e, no entanto, surgem novos espaços de vazio.  Espaços de angústias difusas, de depressão, de fome de alimentos e de afetos, espaços de sentimentos de fracasso, de dissociação ante um mundo invasivo, traumático, concreto, onde os ideais e as utopias nos escapam por entre os dedos.  A ausência de ideais e utopias iguala os sujeitos que têm fome de subjetividade, e que é a mesma fome de cultura.  A subjetividade é assim porque a cultura é assim.  O equívoco de hoje é o pensar apenas um tipo de ação.  Fomos transformados, sem perceber, em repetidores.  O sistema motor é capturado para ter ações repetitivas, antes mesmo de, ao conter-se, fazer o movimento inicial de qualquer pensamento.  Assim, fica impossível o aparecimento de desejo.  Há, apenas, pensamentos-descargas, vinganças que, sem a instância terceira da justiça, tomam mesmo as lideranças, e são pura ação motora, são atos brutais, são violências, não passam pela elaboração da cultura.  Existe pois um vazio, na arte, na arquitetura, na ciência, daquilo que permitiria o convívio e a continuidade.  Um vazio na economia, a espalhar-se pelas diferentes geografias, a se agravar, a se arrastar pela História.  Este vazio parece vir de uma negação dos limites do corpo do homem, somente encontrado no corpo do mundo.  Há, pois, necessidade de retomada de tensões a serem transformadas em novas intenções.  Uma paz dos avanços deve surgir.  

            O caminho das novas invenções vem, paradoxalmente territórios insurrectos, religados aos demais pela intuição e pela criatividade, por um trabalho de Eros, de amor – no campo do sujeito a libido – que dispensa o corrimento do sangue.  Um trabalho baseado em direitos humanos, em democracia e no reerguimento de ideais encarnados em lideranças dignas.  O trabalho com a diversidade da vida é um trabalho do homem, e deverá contar com a intuição e a razão.

            A religiosidade a que nos referimos é a da responsabilidade e do respeito.  É, na expressão de Guimarães Rosa, uma possibilidade de “avistar o grito das araras”.  De rejuntamentos, de religações, no corpo, somente possíveis se o corpo for percebido e reinventado juntamente com a reinvenção do mundo.  Uma nova perspectiva surgirá se pudermos ouvir os clamores do mundo.   
 
Isso envolve um novo trato com o tempo.  Sem tempo para co-mover-se, para encantar-se, o homem somente preparará encomendas à natureza, que o formaliza no mesmo momento em que o “formoliza”.  E as novas distâncias possibilitarão o reencantamento do mundo, promoverão um sem número de lugares onde a natureza externa será a nova cidade, a praça dos novos encontros e desencontros, da co-habitação e da diversidade.  A percepção é sinestésica e produz a religação de caminhos.
            A transdisciplinariedade depende de uma transformação dos sujeitos e está condicionada por uma paixão de ser outro.

I – ACESSO AO CALEIDOSCÓPIO.

            A melhor posição para abordarmos a realidade é a de nos deixarmos tocar pelo mundo antes mesmo de tentar entendê-lo.  Por mais que estejamos condicionados a modelos de entendimento, nesses modelos estão os germes da re-evolução, pois os modelos também são disruptivos.  Na abertura a devires surgirá o novo.  A ética da vida atual nos exige um interesse por ciência, filosofia, arte e religião, quando esses saberes se mostram capazes de se transformarem em algo que terá valor, em parte de um imenso caleidoscópio, em origens de ações.  Não se compreenderia, hoje, o que se convencionou chamar de platonismo, seja na esfera do filosófico e muito menos do político. 





A origem já implica em razões.  É informe e vazia, mas o vazio não é o nada, é o início.  A origem é fundamental como forma de se reescrever o velho em novos espaços.  O pensamento vem no rastro do fazer.
           
O trabalho essencial com a memória e o arquivo, para que se possa andar para a frente, implica em um reexame continuado dos convívios.  A memória e o convívio são as características centrais do ser humano e não existe um sem o outro.  As presenças somente nos prestam serviço na medida em que procuram organizar novas vias para o passado.  Para as presenças trazerem as representações do passado é necessário um espanto, uma perplexidade ante costumes encarquilhados, ante os novos aparecimentos, aparências e novos florescimentos de profundidades.  Os pré-conceitos impedem esse ressurgimento.


            A arte, como um deserto sem caminhos, no qual o homem vai atrás de alguma coisa boa e bela, é elemento de religação.  Não se trata de criar um isolamento de saberes sobre a política, sobre a religião, o estado, o governo, a ciência, a arte, mas de encontrar a forma para o sujeito inventar e inventar-se, valendo-se desses instrumentos, como nos ensinou Freud (1930).

            A turbina acionada na origem do capitalismo moderno ainda não parou de devorar todo o ar que encontra pela frente.  No avião a turbina come o ar e é isso que o faz disparar.  Esta lógica da turbina moderna é incompatível com a lógica do vivente.  A lógica econômica, com seu ímpeto transformador e homogeneizador é incompatível com a diversidade, não só a dos seres vivos como também a geológica, pois os ritmos de consumo da natureza mineral não devem ser desprezados.  A água, o ar, os combustíveis minerais e outros recursos naturais estão sendo exauridos.  As árvores da Amazônia precisam ser defendidas.  A reserva amazônica tem que ser mantida.

            Sem utopias ativas é impossível um caminhar.  O ideal, elemento constitutivo da vida anímica de cada um de nós, como o descobriu Freud (1914), deve encarnar-se em lideranças responsáveis.  Acaso existiria a América sem Bolívar e San Martin (Samaja, 1997)? O cristianismo possibilitou um avanço nas representações do mundo ocidental pois exigiu que Deus se encarnasse (Argan, 1999).  O mundialismo se dá à custa de dominações, de apropriações e de encarnações indevidas de ideais.  O mundialismo é uma faca de dois gumes pois permite a divulgação e a luta por causas justas e também promove domínios, dependências e paralisias.

            O corpo do homem, mergulhado na vida, é limite extremo, é borda.  Há o indizível, o que é maldito, mal pronunciado e pode provocar maldições.  Este indizível se inicia no vazio, se inicia no corpo e em suas inquietudes, no demasiadamente humano.  É o mundo interno, o imundo, cujo remoer permite criações reais, densas, pois “nada mais profundo que a pele”. Há uma descontinuidade entre corpo humano e ambiente, mesmo na sua mais intensa diversidade, pois o corpo é continuamente re-inventado na cultura e na construção do desejo.  Mas há uma continuidade porque o corpo é água, é cadeia de moléculas, vive de alimentos, e o ar lhe corre, como essência, nas artérias.  O corpo do homem é o palco inicial de onde falamos sobre diversidade de seres vivos e inanimados.  A educação do corpo humano tem que ser uma expressão e uma compreensão de vida, como ensina Hortensia Hupia de Holanda (1977).  Expressão e compreensão de vida longe de maldições.  A vida é, além de sobrevida, espaços de convívios.  A vida emocional entre os humanos torna o corpo humano diverso do corpo dos outros animais.  O corpo humano é modificado pelo desejo e pelos percursos, pelos mitos da cultura.  E o corpo e a cultura são construídos com sangue, suor e lágrimas.

            Considerar o corpo como borda entre sujeito e cultura leva-nos a constatar que nada se compara à experiência do corpo, a aprender-ensinar, fora dos ambientes formais da escola.  O exercício do corpo estimula uma aprendizagem participativa.  A observação ganha sentido e as perguntas fluem.  O lazer se entrelaça com o saber, o prazer e a alegria retomam os dispêndios de energia.

            A diversidade implica em conflitos e desgaste de energia.  A cada instante, manter o diferente consome energia.  A vida na diversidade é necessariamente entrópica.  A preocupação com a reposição de energias deve estar hoje em todos os lugares, desde a reciclagem de dejetos da atividade humana até a vida muscular em sua fadiga, na luta cotidiana pela invenção de novos espaços ambientais.

            O mapa desse país de procuras é desenhado, aqui e ali, a partir de bricolagens, de alianças entre diferentes, e a diversidade é uma aliada.  O desenho desse mapa utiliza-se também do controle de resistência aos devires e produz rupturas por onde ressurge o novo.      

            Quantas vezes não convivem em nós mesmos o incentivo a cópias, a prática adaptacionista, não nos faltando a denúncia aos males desse mundo? Esta denúncia não nos faz diferentes de muitos a quem nós criticamos.





II – A META DOS CAMINHOS OU O QUE “ESTÁ PARA ALÉM” DO CAMINHAR.

            A ideia de alegrias, em um mundo de fadigas, parece inadiável.  A ideia de delicadeza, em um mundo de violências, também.  Como dar lugar a sempre novas configurações o caleidoscópio que se desdobrará ao infinito para escrever o roteiro?

            Muitos ingredientes fazem parte da prática da diversidade.  A pluralidade de seres e de manifestações é vital à perpetuação da vida.  A beleza tem morada permanente na variedade. 

            O encontro do grupo para trabalhar com a ideia de diversidade foi possível graças ao reconhecimento do conceito freudiano de ideal.  Os grupos reúnem-se em torno de ideias encarnadas de alguém, alguém autorizado a trazer alguma provocação.  A percepção e o chamado a assumir responsabilidades dependem de uma convocação que mereça ser ouvida.  As pessoas ouvidas se predispõem a ouvir.  O respeito vem de uma capacidade de olhar de novo (re-spectare) e a responsabilidade vem da capacidade de responder a chamados.


Um grupo se reúne em torno da ideia.  E as pessoas devem estar livres para abandonar o grupo a qualquer momento.  Como ajudar os governos com tal proposta, imprescindível para a criatividade, é tarefa de poetas.  Daí a importância do encanto e das emoções, dos afetos, além da razão.




            O trabalho com pequenos grupos parece essencial para o reencontro de caminhos, pois somente no convívio os afetos se manifestam.  As manifestações generosas, as resistências empedernidas, os ciúmes, são todos transportes para a presença de ações situadas, de situações entre os humanos.  Pensar e agir em torno da questão do coletivo, providenciar compatibilizações é etapa posterior ou, quando muito, concomitante.  O conceito de massa, quando falamos do coletivo humano, é inadmissível, uma vez que nega a legitimidade e a grande riqueza da diferença e do lugar do conflito entre os homens e os grupos. (Fontes, 2000; Mendonça, 2000).

           
No trabalho do grupo que produziu esse texto, cada pessoa foi chamada a falar de seu percurso, de seu trabalho e das circunstâncias pessoais que envolviam as atividades nesse trabalho e, também a situar o que lhe possibilitou armazenar sua experiência de vida.  Aí, o exame do que lhe era significativo permitiu uma proximidade com as escolhas dos símbolos definitivos na configuração dos ideais e conduziu a uma reflexão sobre um simbólico e sobre o seu tratamento pela cultura.

            O espaço ideal para o grupo é aquele onde a criação é possível.  O exercício da criação é pôr as mãos no barro, pôr as mãos à obra, construir a morada, construir o costume.  É a criação que religa as gentes e todos os seres.  O saber, desde aprender a andar até o trabalho universitário, é uma aventura, uma procura, até certo ponto consciente, um convite soldado por razão e afetos, cuja função é de servir.  O serviço ao qual o grupo se referia apoiava-se na busca do bem estar, do bem viver: da saúde.  O grupo reconheceu o espaço da Escola Nacional de Saúde Pública como um lugar de legitimação de talentos e competências.  A partir desse ponto pensou-se o que transborda das disciplinas e o que convoca para novos saberes e experiências.  Pensou-se na chamada transdisciplinariedade.  A transdisciplinariedade, para o grupo, implica sujeitos disponíveis a tentar ocupar o lugar do outro, a tentar a paixão de ser outro, a passar a ser quem vai tentar ouvir e, depois, dizer o que o outro consegue ouvir.  Devemos somente dizer do outro o que dele ouvimos, o que escutamos e auscultamos.  Seria possível na transdisciplinariedade, um lugar, uma situação de gerar ações capazes de transformar o mundo, de permitir o surgimento, a invenção do sujeito, no não assujeitado, que só pode nascer nos novos movimentos da cultura?


IV – IDEIAS SURGIDAS NO GRUPO QUE VISAM OUTROS ESPAÇOS DE CO-HABITAÇÃO.

“Trabalhamos no Escuro – fazemos o que podemos – damos o que temos.  Nossa dúvida é nossa paixão e nossa paixão é nosso dever.  O resto é a loucura da arte.”  (Henry James)       

            Vivemos uma época de profundo mal-estar (Freud, 1930).  A palavra da moda é o stress.  Um terço da população mundial estaria deprimida, e melancolia é demanda de novos ideais, de novas formas de liderança, de um novo convívio que valorize e reorganize a memória.  É impossível ir a encontros sem tentar transformar a memória em História.  O corpo do homem atual é possuído de presenças, seduzido por uma especularização despedaçadora que não lhe oferece possibilidade de novas propostas, novas sínteses.  Não encontramos, nos locais de convívio, presenças que possam acolher/sustentar novos projetos de vida.  Como pode um homem não sustentado sustentar o mundo em sua solicitação tão diversa? O abandonado só pode ser solidário se existirem utopias de acolhimento.  A sustentação da solidão, essencial à invenção de novos caminhos e de novos espaços, implica a existência de utopias ativas. Ideais vivos.

O grupo considerou que o trabalho com a diversidade depende de uma organização sempre viva que considere o sensível na borda do inteligível, no limite, na passagem da linha, para empregarmos os termos de Platão (1966).  Não se trata de um grande problema para as massas.  O centro de atenções deve ser o pequeno grupo.  O coletivo virá como consequência.  Os sujeitos existem independentemente da grandiloquência do administrador.  A lógica do sujeito é da ordem da simplicidade.   É preciso diferenciar complexidade de complicação.  A aproximação do humano depende de uma proximidade com os sentires.  Não há porque separar razão de emoção.  A aproximação inteligente para o humano é afetiva.  Lugar para afetos são aberturas, possibilidades para ternuras e raivas, para a manifestação de ressentimentos.  Carinho é uma energia em estado bruto, inibida no encontro.  O encontro não é, necessariamente, o lugar de catarses, mas essas não devem ser ridicularizadas.  Do sublime ao ridículo não há senão um passo. 

Para providenciar caminhos para o fazer/pensar, para criar o centro de uma nova ética no aparecimento do homem livre, devemos lembrar de que o não assujeitado é sujeito, é sujeito de sua ação.  Mas no mundo atual o homem apenas pensa que escolhe, pensa que age a partir de seu pensamento, mas é transformado em sujeito de uma ação escolhida por outrem, é assujeitado, dominado.

O trabalho com a diversidade implica, sempre, em se pensar projetos que são geradores de energia.  Como a reciclagem de lodos, de dejetos, do lixo.






O pequeno grupo, ao soldar novos ideais, lugar de armazenamento, reservatório de energias do espírito, é uma usina para novas ideias.  O pequeno grupo é lugar de reciclagem de ideias e ideais.  E é labor da paixão do encontro, sem medida possível que, no sentido de Hanna Arendt (1977), vê-se somente quando se considera o corpo e a generosidade graciosa de seu trabalho, como na gravidez, na amamentação, na produção do sêmen, na produção do suor.  Por isso, a produção de um pequeno grupo não deve ser devassada, pois nunca se deve invadir, devassar comoções.  E deve ser aguardada, como em todo encontro amoroso, em todo trabalho de Eros, de ligações, da vida (Freud, 1914).

As atividades humanas, além de provocarem alterações ambientais, também têm impactos sociais, que devem ser estudados.   O produto do trabalho, visto de maneira humana, é um complexo de bens e leva em conta a saúde e a integridade física dos trabalhadores.

Em uma sociedade que se respeita, há um respeito pelo Estado e seus líderes, no judiciário, legislativo e no executivo.  Mas não se pode dispensar a sociedade civil.  Vivemos uma época de destituições (desmoralização) dos ideais, pois os ideais não podem existir sem uma encarnação.  Há uma preocupação acirrada com a desconstrução de símbolos históricos, e com a insegurança quanto ao aparecimento de novos.  O apagamento dos símbolos, dos ideais, é o próprio apagamento das lideranças, da chama simbólica que alimenta o pensar, é o apagamento da liderança.  Dispensar o simbólico significa acionar imediatamente o sistema motor, a violência incontrolável. 

A Escola de Saúde Pública e a Fundação Oswaldo Cruz, com a ajuda do Ministério da Saúde, têm suportado algumas demandas e ajudado a transformá-las em projetos sociais.  Na Universidade existem pessoas que pensam/fazem, e, assim, produzem novas vias.

Sabemos que há uma ética e um caminho na construção do ser humano, ou seja, há também uma ontologia e uma ontologia que não se constitua eticamente.  Novos espaços em direção do humano aparecem quando bebemos de todos os saberes.

O homem não sabe por onde caminha nem aonde vai chegar.  Mas sabe que é preciso fazer outro movimento que não aquele com o qual já estamos confrontados e que nos empurra na sua direção, à nossa revelia.
                   





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